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segunda-feira, 12 de julho de 2010

O silêncio

Cigarro aceso, o gosto da nicotina tornava mais amargo o choro engasgado.
O peito doía somatizando a dor da alma. Pernas trêmulas, olhar vazio. Olhava pela janela, a morte seduzia, deixara de ser covardia para se tornar uma opção tentadora. O desespero torturava, tingindo de cinza tudo que estava ao alcance dos olhos. Em vão, tentava entender o que acontecia, precisava entender. Não conseguia aceitar, memórias se dissolviam diante da decepção e catalizavam as lágrimas. Choro, soluços, uma angústia muda, solitária, tinha por testemunhas os arranha-céus, não encontrava consolo.
Imaginava coisas, alucinava de terror. Andou pelo quarto, abriu gavetas, trocou de roupa. Ligou o aparelho de som, revirou os cds, mas já sabia a escolha. Era sua banda favorita, sua música favorita. Cantou a letra com todas suas forças, não tinha mais medos de que reclamassem por ser desafinado. Sua voz soava como um mantra, repetia o refrão quase como uma reza e murmurava "someday yet, he'll begin his life again..." Porém, não acreditava nisso, não mais, não naquela hora.
Já havia tomado sua decisão. Sentou-se no chão frio do quarto. Ouvia o solo, não tinha mais vergonha das lágrimas, nem temia ser visto.
Levantou-se, começou a balançar a cabeça freneticamente, numa dança de loucura e liberdade, finalmente permitia-se ser ele mesmo, sem máscaras, sem receios. Sentia-se auto-suficiente pela primeira e última vez. Sem que percebesse, meia hora se passou e continuava a dançar, mesmo após o final do cd, era sua coreografia, seu ritual sagrado de renúncia.
Esgotado, despencou ao chão, quase sem forças. Os pensamentos não paravam, a mente girava numa espiral sem fim.
Todos seus sonhos saltaram-lhe os olhos num mosaico de sentimentos e imagens. Recortes de planos futuros e nostalgias. Seu mundo colapsava num misto de rejeição e incompreensão. Não era mais parte da entorpecida realidade que o cercava, sequer sabia se de fato um dia foi.
Tudo o que queria era não estar só, ouvir que era importante, que tudo tivera um significado, por menor que fosse. Queria um abraço, um carinho, migalhas de compaixão.
Subiu na janela. Hesitou, precisava ser ouvido. Queria mais do que indiferença. Era o momento de se quebrar a maldição, de ouvir as palavras mágicas que trouxessem redenção, ou paz.
Contudo, não era conto de fadas, não havia final feliz. Abraçou o vazio, suspirou seu destino.
Ouviu o silêncio e não foi ouvido...

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